O COMPONENTE CURRICULAR PROJETO DE VIDA E AS VIDAS EM PROJEÇÃO
Susanna Fernandes Lima
As intenções desse texto se relacionam diretamente à investigação
empreendida enquanto temática de meu curso de Doutorado no PPGHS UERJ FFP, que
se objetiva investigar como o campo do Ensino de História pode contribuir para
a formação da subjetividade dos sujeitos que ocupam os bancos escolares, tendo
em vista a implementação obrigatória do componente curricular Projeto de Vida
na matriz do “Novo Ensino Médio”, que entrou em vigor em 2022, em razão da
alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) por meio da
lei 13.415, de 16 de fevereiro de 2017.
Para início de conversa, pretendo elaborar um
trajeto de referências que oriente o/a leitor/a quanto ao caminho que percorri
para compreender, ainda de forma lacunar, ressalto, os passos para a
implementação e desenvolvimento do Projeto de Vida enquanto componente do
currículo que vem se estabelecendo a partir da obrigatória implementação do
Novo Ensino Médio, em 2022, no Rio de Janeiro.
Importante destacar que sou professora de
História em escolas públicas e privadas no estado do Rio de Janeiro. E ainda
que algumas escolas tenham iniciado seus passos de implementação da BNCC a
partir da publicação da Lei 13.415/17, no caso das escolas estaduais, o modelo
do Novo Ensino Médio tornou-se uma realidade aplicada na prática a partir do
início do ano letivo de 2022.
A Base
Nacional Comum Curricular (BNCC), de 14 de dezembro de 2018, em consonância com
o Plano Nacional de Educação (PNE), de 25 de junho de 2014, estabelece o
Projeto de Vida como componente curricular obrigatório para o Novo Ensino
Médio, válido a partir da Lei nº 13.415, de 16 de
fevereiro de 2017, que altera a Lei n º 9.394, de 20 de dezembro de
1996.
Enquanto parte da política nacional da Educação
Básica, a BNCC objetiva “superar a fragmentação das políticas educacionais, [ensejar] o fortalecimento do regime de
colaboração entre as três esferas de governo e [ser] balizadora da qualidade da educação” em território nacional
(BNCC, 2018, p. 8. Grifos nossos).
Logo em suas primeiras páginas, o texto de
apresentação da BNCC informa que, além de garantir a definição de um conjunto
“orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais” (BNCC, 2018, p. 7) aos/às
estudantes brasileiros/as, o documento normativo estabelece 10 competências
gerais, “que consubstanciam, no âmbito pedagógico, os direitos de aprendizagem
e desenvolvimento” dos/das estudantes (BNCC, 2018, p. 8).
Cabe um esclarecimento, definido pelo próprio
documento normativo, quanto ao conceito de competência: “Na BNCC, competência é
definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos),
habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para
resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania
e do mundo do trabalho”. (BNCC, 2018, p. 8)
As competências gerais, portanto, pretendem
corroborar com o “desenvolvimento integral” do/da estudante, a fim de apoiar
“as escolhas necessárias para a concretização dos seus projetos de vida e a
continuidade dos estudos” (BNCC, 2018, p. 5). Desta forma, cada uma das dez
competências intenciona abordar um aspecto da vida do/a aluno/a, ao longo das
três etapas da Educação Básica, tendo em vista os âmbitos da vida pessoal, do
exercício da cidadania e da formação para o mundo do trabalho. Destaco a
competência 6, que trata diretamente do Projeto de Vida:
“Valorizar a diversidade de saberes e vivências
culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem
entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas
ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade,
autonomia, consciência crítica e responsabilidade”. (BNCC, 2018, p. 9-10. Grifo nosso.)
A competência geral número 6 é a que me
interessa mais de perto, posto que aborda condições necessárias à elaboração do
Projeto de Vida por parte do/a estudante, conforme previsto na Lei do Novo
Ensino Médio: “§ 7º Os currículos do ensino médio deverão considerar a formação
integral do aluno, de maneira a adotar um trabalho voltado para a construção de
seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e
socioemocionais” (Lei 13.415, 2017.).
No que concerne à “formação integral” do/a
estudante, a BNCC informa que está comprometida com uma “construção intencional
de processos educativos que promovam aprendizagens sintonizadas com as
necessidades, as possibilidades e os interesses dos [das] estudantes e, também,
com os desafios da sociedade contemporânea. Isso supõe considerar as diferentes
infâncias e juventudes, as diversas culturas juvenis e seu potencial de criar
novas formas de existir. (BNCC, 2018, p. 14. Grifo nosso.)
É importante ressaltar que, apesar da legislação
informar que a construção do Projeto de Vida deve se dar ao longo do Ensino
Médio, a BNCC aponta esta como sendo uma tarefa que deve ser iniciada no nível
Fundamental, em seus anos finais, a fim de “estabelecer uma articulação não
somente com os anseios [dos/as] jovens em relação ao seu futuro, como também
com a continuidade dos estudos no Ensino Médio” (BNCC, 2018, p. 62. Grifo
nosso).
Outro ponto fundamental, que serve como base
para este início de reflexões, é entender como, na letra do documento
normativo, o Projeto de Vida deve funcionar. Antes, porém, de enunciar essa
etapa, é importante compreender como a Base entende o Ensino Médio. Um
movimento essencial é o de perceber que BNCC pretende operar com o conceito de
“juventudes”, como mencionado acima, por um lado “não [caracterizando] o
público dessa etapa – constituído predominantemente por adolescentes e jovens –
como um grupo homogêneo, nem conceber a “juventude” como mero rito de passagem
da infância à maturidade” (BNCC, 2018, p. 462. Grifo nosso.).
Por outro, assinala que “Adotar essa noção
ampliada e plural de juventudes significa, portanto, entender as culturas
juvenis em sua singularidade. Significa não apenas compreendê-las como diversas
e dinâmicas, como também reconhecer os jovens como participantes ativos das
sociedades nas quais estão inseridos, sociedades essas também tão dinâmicas e
diversas. (BNCC, 2018, p. 463)
Dessa forma, o documento aponta para dois
objetivos: primeiro, acolher as diversidades a fim de alcançar a promoção do
respeito à pessoa humana e aos seus direitos, de forma intencional e permanente
e, segundo, que a escola garanta a alunos/as o protagonismo em sua escolarização,
alçando-os/as à posição de interlocutores no que diz respeito ao currículo e ao
processo de ensino e aprendizagem. Tudo isso com vistas à obtenção de “uma
formação que, em sintonia com seus percursos e histórias, permita-lhes definir
seu projeto de vida, tanto no que diz respeito ao estudo e ao trabalho como
também no que concerne às escolhas de estilos de vida saudáveis, sustentáveis e
éticos” (BNCC, 2018, p. 463).
Nesse sentido, uma escola que acolhe juventudes,
segundo a BNCC, precisa se comprometer com a educação integral de seus/suas
estudantes, e com a construção de seus Projetos de Vida. A partir daí, o
encaminhamento do documento é o de repensar o contexto do Ensino Médio no mundo
contemporâneo, propondo, numa releitura das finalidades desta etapa proposta
pelo artigo 35 da Lei de Diretrizes e Bases, de 20 de dezembro de 1996, novas
metas, que se organizam nos seguintes eixos:
- favorecer a preparação básica para o trabalho
e a cidadania;
- promover o aprimoramento do/a estudante
enquanto pessoa humana, tendo em vista sua formação ética e o aprimoramento de
sua autonomia intelectual e pensamento crítico;
- garantir aos/às alunos/as o entendimento dos
fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, promovendo a
relação entre teoria e prática.
Mediante esses eixos, e suas metas
recontextualizadas, além de “garantir a consolidação e o aprofundamento dos
conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental” (BNCC, 2018, p. 464), o
documento afirma ser “[...] imperativo repensar a organização curricular
vigente para essa etapa da Educação Básica [o Ensino Médio], que apresenta
excesso de componentes curriculares e abordagens pedagógicas distantes das
culturas juvenis, do mundo do trabalho e das dinâmicas e questões sociais
contemporâneas (BNCC, 2018, p. 467-468. Grifos nossos.).
Para dar conta desse objetivo – “repensar a
organização curricular vigente” –, o texto da Base informa que a Lei do Novo
Ensino Médio substitui modelo único de currículo do Ensino Médio por um que se
quer “diversificado e flexível”. Referenciando a Lei, temos:
Art. 4º O art. 36 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 36. O currículo do ensino médio será composto pela Base
Nacional Comum Curricular e por itinerários formativos, que deverão ser
organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a
relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino, a
saber: I - linguagens e suas tecnologias; II - matemática e suas tecnologias; III - ciências da natureza e suas tecnologias; IV - ciências humanas e sociais aplicadas; V - formação técnica e profissional.” (Lei 13.415, 2017. Grifos
nossos.)
É justamente no escopo dos Itinerários Formativos que, no
texto da BNCC, vai se encaixar o Projeto de Vida, que deverá ser elaborado
utilizando-se de pilares como protagonismo e autoria (estes pilares
encontram-se previstos, dentre muitas partes do texto, na 5ª competência geral
da educação básica, que se liga às tecnologias digitais de informação e comunicação),
que teriam sido estimulados ao longo do Ensino Fundamental. Mais do que isso, a
BNCC trata o Projeto de Vida como “eixo central em torno do qual a escola pode
organizar suas práticas” (BNCC, 2018, p. 472).
Assim como eu, você, leitor/a deste texto deve estar, há
algum tempo, aguardando uma definição sobre o que é o Projeto de Vida. De
acordo com o texto da Base, “Projeto de vida é o que [os/as] estudantes
almejam, projetam e redefinem para si ao longo de sua trajetória, uma
construção que acompanha o desenvolvimento da(s) identidade(s), em contextos
atravessados por uma cultura e por demandas sociais que se articulam, ora para
promover, ora para constranger seus desejos. Logo, é papel da escola auxiliar
[os/as] estudantes a aprender a se reconhecer como sujeitos, considerando suas
potencialidades e a relevância dos modos de participação e intervenção social
na concretização de seu projeto de vida. É, também, no ambiente escolar que
[os/as] jovens podem experimentar, de forma mediada e intencional, as
interações com o outro, com o mundo, e vislumbrar, na valorização da
diversidade, oportunidades de crescimento para seu presente e futuro (BNCC,
2018, p. 472-473. Grifos nossos.).
Estamos, nós, educadores/as, trabalhando com projeção de
futuro quando o assunto é a elaboração do Projeto de Vida a partir do que está
proposto no texto da Base. Recupero aqui a intenção principal desta pesquisa,
qual seja: investigar como o campo do Ensino de História pode contribuir para a
formação da subjetividade dos sujeitos que ocupam os bancos escolares, tendo em
vista a implementação obrigatória do componente curricular Projeto de Vida na
matriz curricular do Novo Ensino Médio.
Em Língua Portuguesa, a expressão Projeto de Vida é composta por um nome
– “Projeto” – e por um complemento nominal – “de Vida”. Dar nome às coisas é um
dos estratos da identificação, que possibilita a outras pessoas saberem daquilo
de que pretendemos falar. Mas, esse reconhecimento superficial, esse saber pelo
nome, talvez não seja suficiente para viabilizar o conhecimento das camadas que
compõem aquilo que se pretende conhecer, bem como sua profundidade, seus
detalhes, aquilo que está oculto na aparência.
Leonor Arfuch (2016)
empreende um movimento interessante ao afirmar que questionar a linguagem é um
movimento fundamental em toda investigação narrativa. Ela diz: “A linguagem
como objeto da filosofia, como construtora do mundo, como configuradora da
subjetividade, imprime uma peculiar virada na reflexão, atenuando a fantasia de
apreender o fato puro ou o desejo de alcançar a plenitude do sentido. Quando
pensamos que estamos falando de fatos, advertiu-nos o linguista francês Oswald
Ducrot (1981), na verdade estamos sempre falando de palavras sobre fatos. E a
palavra, além de sua (forçada) pretensão de exatidão, é marcada pela
duplicidade, pela falta, pelo desvio, pelo delírio” (ARFUCH, 2016, p. 236.
Grifo nosso. Tradução livre.).
Aproveitando o
período destacado na citação acima, e retomando o componente curricular que é
objeto desta análise, conforme é possível verificar, não apenas no texto da
BNCC, como também no da Lei 13.415/17, os
currículos do Ensino Médio precisam se reorganizar a fim de que caiba neles
um trabalho voltado para a construção do Projeto de Vida do/a estudante
seguindo o viés do protagonismo desse
sujeito da aprendizagem que está inserido/a na categoria juventudes.
Me pergunto: o que é
necessário para que um currículo escolar se reorganize? A partir de quais
procedimentos ocorre essa reorganização? É preciso levar em conta que há muitas
disputas em torno dos currículos, e que, em se tratando de documentos
normativos que funcionam em nível nacional, essa redação aparentemente
inofensiva aponta para subtrações cruéis sendo manifestadas em ambos os textos.
Currículos também não se constroem sozinhos.
Somado a isso, se
recuperarmos pelo menos uma das propagandas veiculadas sobre o Novo Ensino
Médio ainda em 2017 (https://youtu.be/DFfRjP_hyzM) encontraremos frases como: “com o novo Ensino Médio você tem mais
liberdade para escolher o que estudar”, ou “é a liberdade que você queria para
decidir o seu futuro” sendo ditas por jovens. Uma leitura superficial já
permite identificar outra manipulação acontecendo, afinal, trata-se de colocar
nas mãos dos/as jovens, desses seres ainda em desordem, ainda em processo de
vir a ser, de conscientização de quem são no mundo, esse imperativo poderoso
que é poder escolher o que estudar na escola.
Ainda na introdução,
a BNCC atrela a ideia de protagonismo do/a estudante à de “educação integral”:
“Assim, a BNCC propõe a superação da fragmentação radicalmente disciplinar do
conhecimento, o estímulo à sua aplicação na vida real, a importância do
contexto para dar sentido ao que se aprende e o protagonismo do estudante em
sua aprendizagem e na construção de seu projeto de vida”. (BNCC, 2018, p. 15)
Ora, apesar da rápida
discussão que fiz na segunda seção desse texto, aparentemente, o/a jovem tomado
pela BNCC protagoniza sozinho a sua aprendizagem e o desenvolvimento de seu
Projeto de Vida. O que encontra consonância com o texto proferido por jovens na
peça midiática mencionada acima que foi veiculada quando da reforma que
transformou o Ensino Médio em “novo”.
Não apenas no momento
introdutório, mas, em vários outros, o texto da BNCC aponta para um/a jovem que
existe e se constrói sozinho, aparentemente sem a agência de um/a docente para
mediar essa sua formação. O alicerce desse protagonismo aparece ligado
diretamente aos interesses pessoais desse/a estudante – como a jovem que
afirma, no vídeo, que quer se tornar professora porque é o que ela ama –, ou
quando a própria Base afirma que uma escola que acolhe juventudes deve ter o
compromisso de “Assumir a firme convicção de que todos [as] [os/as] estudantes podem
aprender e alcançar seus objetivos, independentemente de suas características
pessoais, seus percursos e suas histórias [se se] garantir o protagonismo dos
estudantes em sua aprendizagem e o desenvolvimento de suas capacidades de
abstração, reflexão, interpretação, proposição e ação, essenciais à sua
autonomia pessoal, profissional, intelectual e política. (BNCC, 2018, p. 465)
Confesso ver
problemas nessa abordagem, afinal, de onde essa juventude parte para definir
objetivos de vida? De que relações? E como é possível desprezar as diferenças
de características pessoais, percursos e histórias no processo de elaboração
desse “eu que desejo me tornar”, se, ao fim, são esses elementos que nos
diferenciam no mundo, tanto na mão daquilo que em nós é único, irrepetível,
quanto no apontamento para certa condição de precariedade e vulnerabilidade nas
sociedades?
“Não haveria “uma”
história do sujeito, tampouco uma posição essencial, originária ou mais
“verdadeira”. É a multiplicidade dos relatos, suscetíveis de enunciação
diferente, em diversos registros e co-autorias
(a conversa, a história de vida, a entrevista, a relação psicanalítica), que
vai construindo uma urdidura reconhecível como “própria”, mas definível só em termos relacionais: eu sou tal aqui em relação a certos
outros diferentes e exteriores a mim”. (ARFUCH, 2010, p. 129. Grifos da
autora.)
A ideia de um
protagonismo juvenil que se constrói “independente” de muitas coisas que são
fundamentais no que diz respeito à formação do sujeito como sujeito me parece
equivocada. Especialmente por talvez fazer sumir o diálogo fundamental entre
estudante e professor/a, dado que estes dois são elementos que substantivam a
experiência escolar – sem desconsiderar todos os demais componentes que fazem a
roda da escola girar.
Se for verdade que
uma prerrogativa essencial para a elaboração do Projeto de Vida, tomando por
base o protagonismo dessas juventudes, é auxiliar estudantes em seu
reconhecimento enquanto sujeitos, conforme já mencionado acima, como a BNCC
pretende ensaiar que a escola dê conta disso? A partir de que ingredientes,
posto que a dimensão da relação entre professor/a e aluno/a perde seu posto
para um/a jovem que se forma sozinho? Fico com a impressão de que esse processo
formativo do eu não encontra caminho para se realizar – e, precipitadamente ou
não, talvez seja este o objetivo real.
Por hora, encerro
este texto com uma questão que abre para a continuidade deste que será um
capítulo em minha tese de doutorado: “Como pensar a questão do biográfico no
campo da educação? [...] Por outro lado, e este é o aspecto, penso eu, menos
contemplado e sobre o qual gostaria de insistir, está a questão da biografia em
sala de aula, o que ela supõe em relação às experiências dos sujeitos no processo
educativo. Porque na tensão uniformizadora da escola, em sua pretensão de
universalidade, muitas vezes o grupo prevalece sobre as individualidades e seus
próprios traços se diluem em categorizações de ordem geral”. (ARFUCH, 2016, p.
240. Tradução livre.)
Referências Biográficas
Susanna Fernandes Lima, professora de História na rede estadual de ensino do Rio
de Janeiro (SEEDUC). Estudante de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em
História Social do Território da UERJ-FFP (2021), na linha de pesquisa Ensino
de História e Historiografia. Mestre em Ensino de História (2021) pelo Programa
de Pós-Graduação em Ensino de História da UERJ - Mestrado Profissional em
Ensino de História/PROFHISTORIA. Participa do Núcleo de Estudos sobre
Biografia, História, Ensino e Subjetividades (NUBHES) - grupo de pesquisa
cadastrado no CNPq - na linha de pesquisa Razão biográfica, escrita e
ensino/aprendizagem da História.
Referências Bibliográficas
ARFUCH, Leonor. O Espaço Biográfico. Dilemas da Subjetividade
Contemporânea. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.
ARFUCH, Leonor. Subjetividad, memoria y
narrativas: una reflexión teórica y política en el campo de la educación.
Magis, Revista Internacional de Investigación en Educación,. v. 9, n.(18), p.
227-244, ano?.
BRASIL. LEI N° 13.005/2014, de 25 de
Junho de 2014. Disponível em:
https://pne.mec.gov.br/18-planos-subnacionais-de-educacao/543-plano-nacional-de-educacao-lei-n-13-005-2014
BRASIL. LEI Nº 13.415, de 16 de Fevereiro deDE
2017. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13415.htm
BRASIL. MEC. Base Nacional Comum Curricular.
Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB,
2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/pesquisar?q=Humanas&t%5B%5D=39
Olá Susanna! Seu texto traz diversas provocações necessárias diante da contrarreforma em andamento. Vou colocar mais uma: como pensar a construção de um projeto de vida sem considerar as condições materiais e históricas que interferem diretamente nas escolhas individuais e coletivas?
ResponderExcluirOlá, Sandra! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Sua provocação é uma grande questão que tenho enfrentado. Quando me proponho a aproximar as reflexões sobre a Reforma do EM à Reforma Trabalhista, é justamente por considerar que há muitas perdas - individuais e coletivas - em curso desde a implementação de ambas. Qual é o horizonte possível para "projetar uma vida" diante da retirada de direitos em curso, e, a depender do público, da dificuldade em manter-se vivo? Enquanto professora da educação básica, tenho notado uma grande dificuldade por parte de meus/minhas alunos/alunas em olharem para o ano de 2023, que já está às portas... Enfim, espero que o andamento da pesquisa, e consequente desenvolvimento da tese, possa nos ajudar a ver tudo isso com mais clareza, de modo que
Excluirque possamos usar as brechas possíveis para novas ações que nos permitam sonhar e, com isso, dar sentido às (nossas) vidas. Um abraço!
obrigada!
ExcluirObrigada pelo seu texto Susanna, será uma belíssima tese. Gostaria de saber qual a relação entre os projetos de vida previstos no novo currículo e os discursos de meritocracia e empreendedorismo presentes nas atuais reformas educacionais.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirOlá, Lívia! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Sua questão é um dos motes que carrego comigo. O componente curricular Projeto de Vida, que integra o ensino médio após a reforma de 2017, estabelece parâmetros de construção de sujeitos e identidades que correspondem a um desenho de subjetivação neoliberal, no qual o indivíduo busca controlar o curso de sua vida sendo empreendedor de si mesmo, e atendendo ao modelo de relação social que se pauta no viés da competitividade e do bom desempenho. Uma pista interessante é observar que a BNCC do EM apresenta o/a estudante como ser que se constrói praticamente sozinho, uma vez que educadores/as têm seus papeis praticamente apagados ou subssumidos à essa construção de sujeitos. Faz parte de meus objetivos investigar as possíveis aproximações do que está proposto na BNCC do EM ao discurso meritocrático - e acredito que os manuais didáticos já disponíveis para uso nas escolas serão de grande valia para essa etapa -, de modo a fazer emergir a narrativa que se pretende construir em torno desse sujeito (neoliberal) que projeta sua própria vida. Um abraço!
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirVejo a matéria de projeto de vida como não muito importante, como um formando do ensino médio (2019) minha experiência com essa materia nâo foi muito boa, eu via como só mais um matéria e não dava muita impôrtancia, talvez seja normal do aluno pois não teve acesso a essa matéria nno ensino fundamental II como foi o meu caso, para os novos alunos ingressantes no ensino médio é normal pensar assim? Para mim é uma matéria que não se vale a pena por muita importância, meus pensamentos são errados referente a essa matéria?
ResponderExcluirOi, Cleverton! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Não acredito que seus pensamentos estejam errados a respeito desse componente curricular. Na verdade, acredito que ele revele o pensamento comum da maior parte dos/das estudantes do EM, uma vez que a "disciplina" parece de ter caído de paraquedas no colo (ou na cabeça!) de cada um de vocês, e também de nós, professores/as. O fato é que, se a implementação ocorresse de uma forma mais planejada, o curso do Projeto de Vida poderia contribuir muito para o planejamento de vocês para a vida que acontece após o fim do EM. Uma pena que não tenha sido assim para você - e para muitos/as. Espero que minha pesquisa contribua um pouco para rever e modificar esse cenário. E já te parabenizo pelo interesse em ler materiais sobre o assunto. Quem sabe você será mais um a colaborar para mudar esse estado de coisas, não é mesmo? Um abraço!
ExcluirGostei muito do seu texto, Susanna. Sou professora da rede estadual de ensino do Ceará e leciono Projeto de Vida desde 2019, mas confesso que o currículo da disciplina me trás algumas inquietações, uma vez que trabalha muito a ideia de "socioemocional", de maneira bem psicológica e individual, distanciando sobretudo as condições materiais e sociais da realidade dos estudantes. Como você sente isso na sua prática docente?
ResponderExcluirGostei muito do seu texto, Susanna. Sou professora da rede estadual de ensino do Ceará e leciono Projeto de Vida desde 2019, mas confesso que o currículo da disciplina me trás algumas inquietações, uma vez que trabalha muito a ideia de "socioemocional", de maneira bem psicológica e individual, distanciando sobretudo as condições materiais e sociais da realidade dos estudantes. Como você sente isso na sua prática docente?
ResponderExcluirVANDERLENE DE FARIAS LIMA
OI, Vanderlene! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Fico feliz em saber que minha pesquisa te alcançou aí no Ceará, e despertou inquietações que me parecem comuns todos/as que irão trabalhar com esse componente curricular. Dito isso, sinto o mesmo com relação à essa demanda associada ao contexto socioemocional. Vejo colegas comentarem que seus/suas alunas relacionam a aula de PV a sessões de terapia - o que é um erro gigante -, mas, tem sentido, uma vez que as diretrizes para o trabalho com a "disciplina" ainda são obscuras e muito mais pautadas pelos materiais didáticos que por orientações curriculares, propriamente. Além disso, considero que, neste primeiro momento (2017-2022 +), estamos trabalhando conteúdos muito mais direcionados por nossos achismos - o que é efeito direto da forma como as coisas estão sendo implementadas - do que por meio de discussões curriculares mais profundas, uma vez que não somos (nem existem) especialistas na área, né? São muitos os problemas com esse componente e, infelizmente, os resultados até o momento não agregam valor para a vida dos/das estudantes, nem para projetar esse futuro que é "horizonte de expectativa". Um abraço!
ExcluirVerdade, Susanna. As inquietações são bem semelhantes. Ainda precisamos estudar muito e aprimorar o currículo desse componente para atender melhor nossos estudantes.
ExcluirVANDERLENE DE FARIAS LIMA.
Esse é um tema que me interesa pois lembro de ter a competência de projeto de vida no meu 3° ano do ensino médio, na minha opinião é muito fundamental mas também lembro de que minha professora de projeto de vida nunca teve experiência nesse aspecto, ela era professora de história que por conta da grade de matérias do novo ensino médio, teve que pegar a matéria de projeto de vida, a minha dúvida a respeito é, você acha que para um professor ensinar nessa matéria, ele não deveria ter uma mínima experiência na área de psicología ou afins? Pois é uma matéria que mexe muito com o psicológico e emocional do aluno e sem um treinamento, o professor não será tão apto para as vezes tocar em temas que podem ser delicados para o aluno.
ResponderExcluirOi, Anderson! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Você aponta uma questão muito importante nesse debate: não existe formação para professores/as de Projeto de Vida. Então, por enquanto, acredito que isso - professores de outras áreas assumindo as aulas desse componente curricular - seguirá acontecendo. Outra coisa é a abordagem psicológica. Todos nós, professores/as, cursamos disciplinas de Psicologia da Educação em nossas graduações. Então, um mínimo de conhecimento da área nós temos. Minha impressão é que essa abordagem, no entanto, não é exatamente o que o componente de PV objetiva construir. Ainda que, sem dúvida, exista uma aproximação com questões sensíveis, tanto em âmbito particular, como em âmbito coletivo, porém, me parece, pelas leituras e pesquisas que fiz até o momento, que as demandas de PV estão mais associadas a um desenho de construir caminhos ou passos para se alcançar um futuro profissional. Talvez esse encaminhamento mais psicológico se deva ao fato de que nós, professores/as, não recebemos muitas orientações e formação para atuar nessa área (PV), então, acaba acontecendo esse "perder-se" pelo caminho. Eu diria que esse é mais um problema tanto da Reformado EM, quanto da maneira como a implementação do novo currículo está acontecendo. Um abraço!
ExcluirGostei muito do início do texto. Mas ao fim, me decepcionei. Desde a Graduação, que terminei ano passado, não vejo com bons olhos o posicionamento da academia em apenas ver o que supostamente falta na BNCC (ou mesmo nas diretrizes anteriores), sem enfatizar aquilo que ela possibilita. A partir do texto da Base fica nítido, como foi exposto no início do texto, que ela permite e incentiva em Projeto de Vida discutir junto ao aluno suas formas de ver o mundo e de planejar seu próprio futuro. Isso é fundamental. Permite que a individualidade do aluno seja considerada em sua integralidade, o que é proposta da Base. A sua comunicação no início deixa isso explícito, mas ao fim parece se contradizer. Em determinado momento afirma que:
ResponderExcluir"Uma leitura superficial já permite identificar outra manipulação acontecendo, afinal, trata-se de colocar nas mãos dos/as jovens, desses seres ainda em desordem, ainda em processo de vir a ser, de conscientização de quem são no mundo, esse imperativo poderoso que é poder escolher o que estudar na escola."
Afinal, ao longo de todo o texto mostrava, com textos da própria Base, que o Projeto de Vida busca justamente contribuir com o processo do aluno de vir a ser, considerando o fundamental: suas visões sobre o hoje e o futuro.
Creio que não se pode dizer que é um peso "dar aos jovens" a possibilidade de escolha. A realidade é que eles já possuem isso, ninguém dá a eles isso. Também pesquiso Educação. Minhas pesquisas são em campo. Visito escolas, observo seus ambientes e interações, converso com Professores, Diretores, etc. Além disso, me interesso por egressos do Ensino Básico. Vejo que as escolas não se preocupam com o que os alunos pensam sobre o hoje e sobre o futuro. Já os egressos, analisam que para chegarem onde estão as disciplinas do Ensino Médio foram muito mais um empecilho do que contribuição. E as relações que desenvolveram, ou participações em projetos fora das disciplinas, é que ajudaram em sua formação como pessoa (é meu caso também). Para a área que seguiram (donos de empresas, professores, engenheiros, funcionários de empresas, etc) as disciplinas obrigatórias não ajudaram em nada (os 3 anos de Ensino de história da Escola não me ajudaram na Graduação em História). Mas seus caminhos foram decididos por eles (até pelos que desistiram do Ensino Médio) e na imensa maioria das vezes não tiveram auxílio nem da família para pensar os passos que trilharam. Vejo que pelo texto da Base, o Projeto se Vida permite e incentiva que as Escolas se importem com a forma que os alunos entendem a realidade e como se observam dentro dela. Auxiliar o alcance de seus objetivos, pessoais e profissionais, a partir do momento que escuta e pensa junto com os próprios alunos. Os alunos estão fazendo decisões a todo o momento. Em quanto eu decidi entrar para Universidade - e decidi isso no Ensino Médio- e agora para um Mestrado, meu irmão decidiu largar o Ensino Médio. Com 20 anos não tem essa formação simplesmente porque não quis. As formas de ver o mundo e o resultado do vir a ser é diferente para cada pessoa. Caso o Projeto de Vida não contribua no processo de vir a ser (o que discordo totalmente) as disciplinas obrigatórias atuais - na forma que são ministradas - absolutamente não contribuem. Qual o sentido então? Eu vejo o Projeto de Vida como fundamental para os jovens em formação.
O ponto crucial é, todos da Escola devem ler a Base e buscar alcançar seus objetivos. Mas na realidade que observo em minhas pesquisas nas Escolas é que eles muitas vezes nem realizam a leitura do Projeto Político Pedagógico da própria escola, menos ainda da BNCC.
Cordialmente,
Wendell Presley Machado Cordovil
Oi, Wendell! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Primeiro, sinto muito por suas experiências, pessoais e escolares, narradas em seu comentário. No entanto, preciso dizer que minha pesquisa se dirige para um olhar geral sobre a implementação do novo texto da Base, com foco no que vem acontecendo no Rio de Janeiro (local onde desenvolvo minha pratica docente), e não pretende analisar casos isolados, justamente pelo caráter social desse processo. Dito isso, acredito que nosso ponto de divergência está, justamente, na viabilidade, que a Base não dá, e que a maneira como a implementação desses novos componentes curriculares também não dão, do que o texto da própria Base propõe - aliás, é importante considerar aquele velho dito popular: "na prática, a teoria é outra". E esse texto da Base ignora diversas realidades que são múltiplas nos vários locais do país onde existem escolas de EM. Eu, e muitos/as outros/as professores/as enxergamos problemas nesse texto, que aparenta investir e apresentar sugestões "interessantes" para as aulas, uma vez que, na prática, nada tem sido feito para viabilizar o que está proposto na BNCC. E como o caráter desse texto é normativo, ou seja, são as novas regras do jogo educativo, pedagógico, fica difícil tornar tudo isso real e realizável sem aporte das secretarias de educação para que os/as docentes sejam formados na área, e possam, assim oferecer uma construção de saberes que seja democrática, de qualidade, incluindo todos os elementos que fazem a engrenagem de uma escola funcionar. A figura do/a professor/a está, por exemplo, praticamente apagada no texto da Base - e, ainda que talvez você pense o contrário -, ninguém se constrói sozinho. Nossas dimensões de existência no mundo são sempre relacionais. Mas, essa individualização excessiva, essa construção de si por si mesmo, esse empreendedorismo de si, representam apenas mais um dos vieses do neoliberalismo e do que ele tem causado nas relações escolares. O resultado disso é, basicamente, professores/as precisando se reinventar cotidianamente, diante de situações que fazem parte do seu dia a dia, sem que sequer tenham sido consultados/as (além do fato de assumirem componentes curriculares para os quais sequer possuem formação e investimento teórico), e alunos/as frustrados/as, como seu próprio comentário revela, por esperarem coisas de uma escola que está sendo engolida por interesses de mercado, e mal dá conta de se manter funcionando diante do mínimo necessário que deveria oferecer. Perdemos todos/as. Um abraço!
ExcluirBoa tarde, ótimo texto. O que gostaria de saber sua opinião é sobre como isso será efetivamente implementado nas escolas, principalmente algumas públicas e se esse currículo novo de alguma forma poderá influenciar também nos currículo dos cursos de licenciatura visando uma nova formação?
ResponderExcluirGustavo Luiz da Costa Racco
OI, Gustavo! Obrigada por seu comentário e pela leitura desse texto ainda inicial da minha pesquisa. Bom, a implementação tem acontecido de forma impositiva, sem diálogo com as categorias envolvidas, tendo professores/as das mais diversas áreas do conhecimento assumindo novos componentes curriculares sem, no entanto, contarem com qualquer formação para isso - então, há muitos desastres em jogo. E muitos desconfortos tanto para professores/as (e equipes diretivas), como também, e principalmente, para estudantes do EM. Quanto à sua segunda questão, eu imagino que isso esteja sendo considerado (em se mantendo o desenho desse novo EM), mas, confesso que ainda não vi nada a respeito dessa discussão alcançar a formação construída pelas licenciaturas. Como ainda existe uma disputa em jogo (revoga ou não revoga o novo EM), talvez o olhar ainda não tenha se dirigido para os currículos das licenciaturas. Um abraço!
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